XII DOMINGO TEMPO COMUM – ANO B
Solenidade nascimento S. João Baptista
24 de Junho de 2018
AS LEITURAS DO DIA
Is 49, 1-6: Vou fazer de ti a luz das nações.
Salmo 138: Eu vos dou graças, Senhor, porque maravilhosamente me criastes.
Actos 13, 22-26: João tinha proclamado, antes da vinda de Cristo…
Evangelho Lc 1, 57-66: O seu nome é João.
A PALAVRA É MEDITADA
A solenidade do nascimento de João Baptista permite-nos traçar as linhas essenciais desta figura cujo nome é usado por tantos homens e mulheres. Um nome, aliás, com significado sugestivo: liga-se a um verbo hebraico que está na base do substantivo "graça" (hnn).
O rei diante do súbdito amado sente ternura e enche-o de “graça”, pelo que o súbdito se torna "gracioso", transfigurado, glorificado. Este sentido do nome “João” é naturalmente para entender de modo religioso: para usar uma expressão aplicada por Lucas a Maria, "João" é "cheio de graça", envolvido pelo amor de Deus desde as suas origens, naturalmente em condições e forma diversas relativamente às da Mãe do Senhor.
Do Baptista falam-nos os quatro Evangelhos, os Actos dos Apóstolos e o histórico judaico José Flávio, contemporâneo de Paulo. Este último na sua obra Antiguidades Judaicas, apresenta-nos João como um mestre rico de piedade e de virtudes, baptizador mas só em sentido ritual, preso e decapitado pelo rei Herodes Antipas no forte de Macheronte sobre o Mar Morto por temor que à volta da sua figura se coagulasse o descontentamento popular contra o regime herodiano. Alguns estudiosos sublinharam também os pontos de contacto da pregação e do batismo de João com a vida e as crenças da comunidade "monástica" judaica de Qumran, na margem ocidental do Mar Morto, conhecida pelas sensacionais descobertas dos textos da sua "biblioteca" a partir de 1947.
Contudo, ele ergue-se sobretudo como aquele que proclama uma reviravolta radical, uma conversão da existência e não uma simples pureza ritual. Ele é pois aquele que anuncia não só os “últimos tempos” de forma genérica, ou uma era messiânica mas uma precisa figura de Messias, Jesus de Nazaré. Este é “o mais forte” relativamente ao qual não se sente digno sequer de ser um simples escravo, aquele que desata ao seu senhor as correias das sandálias.
Sabemos também que à volta do Baptista se tinha constituído uma comunidade de discípulos dos quais alguns se puseram com alegria no seguimento de Jesus, enquanto outros, se alistarão á volta de João mesmo depois da sua morte numa espécie de “comunidade baptista” autónoma de carácter rigorista. De facto, nos Evangelhos lemos frases deste género: "Porque é que os discípulos de João jejuam?... Senhor ensina-nos a rezar como também João ensinou aos seus discípulos".
Mas a fisionomia espiritual do Baptista está ligada a alguns traços fundamentais. Antes de mais o seu nascimento glorioso, narrado por Lucas numa página muito intensa de que a Liturgia de hoje nos oferece o texto central. Ele é por excelência dom de Deus, dado que nasce da velhice estéril de Isabel e da incredulidade “muda” de Zacarias. Ele é o profeta definitivo: "Tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo... João um profeta? Sim, digo-vos, e mais que um profeta". Ele está cheio do Espirito de Deus desde o ventre materno porque a sua missão será totalmente consagrada a Deus e ao seu Cristo.
O segundo traço do seu retrato está na sua voz, tempestuosa como a dos profetas antigos, e no testemunho que não conhece hesitações. Como dirá Jesus, João não é uma cana que se dobra ao vento, é um carvalho que só pode ser partido.
Eis, então, o terceiro traço ligado a um acto preciso, o do baptismo de Jesus. A voz do Baptista e a sua mão apontam direitas para aquele homem que está na multidão dos ouvintes: "Eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo!". E o baptimo que ele realiza sobre Jesus transforma-se numa grandiosa epifania divina. Cantará o evangelista seu homónimo: "Ele veio como testemunha para dar testemunho da luz. Ele não era a luz...".
O último traço do Baptista está na doação total, no estilo dos grandes profetas. Os Evangelhos referem-nos a paixão e a morte de João numa narração ampla e cheia de veneração. A sua tinha sido a história de um homem extraordinário que tinha tido a consciência da grandeza da sua vocação mas também do limite da sua missão.
Belíssimo a este propósito é o auto-retrato que ele esboça com base numa tradição judaica, a do '"amigo do esposo", isto é, do mediador oficial entre o esposo e a esposa antes das núpcias: "Não sou eu o Cristo. Quem possui a esposa é o esposo; mas o amigo do esposo exulta de alegria à voz do esposo... é preciso que Ele cresça e eu diminua".
A PALAVRA É REZADA
Houve uma extraordinária convergência
naquele dia entre as palavras do sacerdote Zacarias
e de Isabel, sua mulher.
O seu filho é certamente um dom de todo inesperado
que atingiu um casal idoso e por cima uma mulher estéril.
E portanto não se pode inserir na história das gerações
reproduzindo o nome do Pai.
Chamar-se-á, portanto, João, porque Deus assim quer:
naquele nome está encerrada toda a sua missão.
“Deus faz graça” e ele, o Baptista, deverá anunciar, Jesus,
a tua vinda ao meio dos homens
e indicar-te presente para que te escutem e te sigam.
“Deus faz graça” e ele, o Baptista,
consagrará a sua voz e toda a sua vida
a despertar a espera, a pedir conversão, a preparar os corações.
“Deus faz graça” e ele, o Baptista,
não fará nada para ocupar a cena porque quem faz a vontade de Deus
sabe que tem uma missão a cumprir e honra-a até ao fim.
Mas depois põe-se de parte, para que Deus
se possa manifestar sem empecilhos.
Ámen.
(In Qumran, e La Chiesa: tradução livre de fr. José Augusto)