III DOMINGO TEMPO PASCAL – ANO A
26 de Abril 2020
AS LEITURAS DO DIA
Actos 2, 14.22-33: Não era possível que Ele ficasse sob o domínio da morte.
Salmo 15: Mostrai-me, Senhor, o caminho da vida.
1Pedro 1, 17-21: Fostes resgatados pelo sangue precioso de Cristo.
Evangelho Lc 24, 13-35: Conheceram-no ao partir o pão.
A PALAVRA É MEDITADA
Acontece que também connosco ao longo da vida, algumas expectativas que não se concretizam, sonhos que são desfeitos por uma realidade que se apresenta diversa de como a quereríamos. Acontece não conseguir ler dentro dos acontecimentos da nossa vida que existe uma lógica maior que nos ultrapassa, tempos que transtornam os nossos projetos. É por isso fácil desencorajar-se, e abandonar os compromissos assumidos, deixando que o coração se encha de nostalgias se não mesmo de amargura e de algum rancor. É assim que ficamos escleróticos no coração e lhe impedimos de se abrir à novidade de uma vida diversa, de uma lógica que corre por outras estradas.
1. Os discípulos de Emaús, constituem – através da narração de Lucas – o pretexto, claro e profundo, de uma dupla reflexão. A primeira, reconhecível também pelo leitor mais distraído, está toda encerrada no sentido de desorientação, de incredulidade, de desconfiança que acolhe os discípulos diante da dificuldade da compreensão: a morte de Cristo, com as suas modalidades atrozes, é por eles entendida não como a realização do designo de Deus, mas como o seu incompreensível e injustificado abandono.
Toda a avaliação, todavia, deve ser o fruto de uma análise atenta, e os próprios discípulos, portanto, deveriam ter considerado a morte do Messias anunciada pelas Escrituras e pelos profetas, não como o fim de uma vida e de um projeto, mas como o evento extraordinário e irrenunciável para que o próprio projeto de Cristo se cumprisse. Com efeito, os juízos apressados, as conclusões baseadas na aparência, as fracas certezas correm o risco de chocarem com os conteúdos de uma realidade diferente, com a verdade da Palavra, com a sacralidade dos factos. E também hoje, num modo que se mostra sempre mais frenético e confuso, o temor de cair em avaliações sumárias está vivo e perigoso mais do que nunca.
Jesus, então, uma vez mais se torna guia e mestre, lembrando aos discípulos, sem ser reconhecido por eles, o exato conteúdo das Escrituras e, portanto, a importância de saber ler a realidade, sobretudo a inesperada e que vem desconcertar os próprios planos, ligando-a à Palavra de Deus. Mas é suficiente? É suficiente a explicação de um Cristo não reconhecido para preencher as incertezas dos discípulos, pondo fim ao seu sentimento de incredulidade e de desconfiança? Embora tendo o coração aquecido pelas palavras pronunciadas pelo Mestre, não basta! Eles ainda têm dificuldade em acreditar e a reconhecê-lo. Assim como não foram suficientes as narrações das mulheres que, tendo ido ao sepulcro, não encontraram o corpo morto de Jesus Crucificado, mas anjos celestes, prontos a referir: "Ele está vivo!".
Em todo o caso, a incredulidade dos discípulos, na presença do mistério pascal, e da ressurreição, representa o limite profundo da natureza humana, que para ser superado é indispensável uma relação profunda e contínua com Cristo, luz do mundo e esperança da vida. Só aquele que consegue conformar a sua existência com os ensinamentos de Cristo encontra a capacidade de superar o obstáculo constituído por visões limitadas, centradas não sobre a lógica de Deus, mas sobre a pessoal que está encharcada de fragilidade e pecado. Cristo convida os dois companheiros de viagem a não ficarem à superfície, na aparência das situações e dos factos, mas solicita-os a penetrá-los, a saber ler os sinais de uma Presença e de uma história que superam o aparente fracasso.
2. Depois que Jesus tinha explicado o sentido das Escrituras, os discípulos e Emaús, quase inconscientemente, percebem uma extraordinária atração pelo Mestre não reconhecido e com amorosa atenção convidam-no a ficar com eles. E é a este ponto que se abre a segunda reflexão. Cristo quando estava à mesa com os discípulos "Tomou o pão, disse a bênção, partiu-o e deu-lho. E eis que se lhes abriram os olhos e o reconheceram".
Por efeito da incredulidade e a desconfiança deixam o lugar a uma paz reconciliadora consigo mesmos, e com o mundo. O gesto de partir o pão, a mensagem encerrada na eucaristia, é aquilo que permite aos discípulos reconhecer Cristo no meio deles. É o repetir-se deste mesmo gesto, com um ritual e uma sacralidade sempre renovada, é a expressão mais alta do testemunho. A fração do pão, a celebração eucarística, portanto, concretizam a Palavra de Deus, um Deus que se fez homem e viveu entre os homens para ser compreendido, amado, como um entre tantos, mas reconhecido como Filho de Deus que por eles venceu a morte dando a todos a possibilidade de ressuscitar.
A verdadeira testemunha é, portanto, o discípulo, o homem, o filho que através do sacramento da eucaristia se aproxima a Cristo e recebe o dom iluminante do Espírito. O pão abençoado, partido, e distribuído, através da celebração eucarística, permite-nos também a nós, hoje, reconhecer o Senhor e acolher o seu mistério, sobre o qual s efunda a nossa vida. Mas para eu tudo não seja um fim em si mesmo, para que a mensagem evangélica da eucaristia viva dentro de nós com força renovada, é importante tornar-se testemunhas presentes e conscientes. Quem recebe o dom do Espírito, e com a força do Espírito recebido entra em Cristo, deve, como os discípulos de Emaús, não fugir, mas regressar aos irmãos e testemunhar-lhes: Cristo ressuscitou e eu com Ele!
A PALAVRA É REZADA
Senhor, tantas vezes me vem a tentação de me ir embora sozinho, de deixar que os outros se arranjem sem mim. Sinto a fadiga de ter que parar para esperar quem caminha lentamente ou lhe ataca o cansaço, enquanto eu gostaria de correr para diante. A estrada a percorrer é muito longa, não vejo a hora de chegar e toca-me perder tempo com quem não tem vontade de caminhar.
Mas Tu, Senhor, fazes-me perceber que estou errando. Sozinho poderia talvez chegar primeiro, mas Tu me pedirias contas dos meus irmãos, e seria condenado a retroceder ao último lugar.
Ensina-me, Senhor, a paciência de esperar, a generosidade de ajudar os outros a descobrir a beleza do caminho, a humildade para não me considerar o melhor de todos. Não é importante que um chegue em primeiro, mas que o último de nós possa chegar à meta apoiado por uma comunidade de irmãos e irmãs.
Pela estrada nunca estamos sozinhos, porque Tu caminhas connosco, como fazias com os discípulos de Emaús, e nos ensinas a repartir o pão com os irmãos, para retomar a estrada com entusiasmo e com esperança nova.
Ámen
(In Qumran, e La Chiesa: tradução livre de fr. José Augusto)